Política

Supremo interesse! As consequências da escolha a ser feita por Lula para Ministro do STF.

Supremo interesse! As consequências da escolha a ser feita por Lula para Ministro do STF.

“Você é livre para fazer suas escolhas, mas é prisioneiro das consequências”

Pablo Neruda

Definido o primeiro nome para integrar o Supremo Tribunal Federal (STF) nas duas vagas abertas este ano, iniciou-se a corrida para a indicação do segundo nome, cuja escolha se dará a partir de outubro de 2023. A especulação corre solta. Todos os dias surgem novos nomes para compor o tribunal. Alguns têm legitimidade para concorrer a vaga, outros se colocam na corrida sem a menor chance de ser escolhido, mas como forma de autopromoção.

A imprensa vem pressionando o Presidente Lula para que o novo indicado seja uma mulher e de preferência negra. Sustentam que irá preencher duas quotas de representação minoritária ao mesmo tempo. Críticas são feitas ao Presidente pelo fato dele afirmar que fará uma escolha pessoal e não baseada em indicações de terceiros, ou critérios de representatividade social.

Entendo perfeitamente a posição do Presidente Lula. Explico. Num Brasil mais estável e menos afeto a ciclos políticos agressivos, a escolha do ministro do STF se resumiria aos critérios estabelecidos na Constituição Federal, qual sejam, notório saber jurídico e reputação ilibada, levando em consideração postulantes com maior representatividade da sociedade, tal como feito pelo próprio Presidente Lula nos seus mandatos anteriores. Naquele período foram nomeados um ministro negro (o primeiro da casa), um ministro nordestino e uma ministra mulher. Lula expandiu o critério de representatividade social dos ministros da mais alta corte.

O Brasil mudou e o STF politizou-se enormemente.

Num Brasil sereno o STF julga questões constitucionais pós efeitos políticos. Decide, portanto, o efeito jurídico da lei considerada inconstitucional. No Brasil atual, o STF decide causas que afetavam as políticas em vigor, julgando a constitucionalidade de medida recém aprovada no Congresso. Ou seja, como detentor da última palavra, o STF passou a decidir os caminhos políticos do País. Isto se dá pela incompetência dos demais Poderes nas atribuições que lhes são dadas pela Constituição Federal. Se o Congresso demora a formular leis, o STF o faz. Se o Executivo é incompetente na execução das leis e projetos, o STF toma seu lugar. As decisões monocráticas, aquelas exaradas por um único julgador, ganharam volume. Ministros passaram a ser expostos e pressionados publicamente até ao ponto de serem ameaçados de morte. Criou-se uma cizânia social, onde ministros são aplaudidos ou vaiados nas ruas em função de suas decisões. O cenário se assemelha a torcedores de futebol apaixonados de times rivais, mas que neste caso os jogadores são os ministros do STF. O brasileiro comum conhece de cor e salteado os nomes dos 11 ministros da Corte, mas sequer conseguem elencar o time titular da seleção brasileira de futebol masculino, coincidentemente composta por 11 profissionais.

Aqueles ministros menos resilientes sucumbiram a pressão popular e passaram a decidir com base na opinião publica. Mudavam de posição rapidamente se os ventos das ruas tomassem outras direções. Jurisprudência passou a ser mera retórica. Precedentes jurídicos já não valiam mais como forma argumentativa, e as leis passaram a ter uma interpretação bem elástica. Com isso, a segurança jurídica foi para o espaço. Já não se decidia mais pelo mérito do processo, mas pelo impacto da decisão na opinião publica.

Pois bem, neste cenário politizado a classe política e determinados empresários “devidamente selecionados” foram vítimas da Lava Jato e perseguidos incessantemente pela organização criminosa de Curitiba. Lula foi preso por 580 dias e enxovalhado publicamente por parte da imprensa e da direita radical que pouco tempo depois chegaria ao Palacio do Planalto.

A posição claudicante do STF nas barbaridades cometidas pela Lava Jato teve consequências dramáticas no universo político e econômico. Se o Supremo Tribunal Federal tivesse agido a pulso firme há época das aberrações da Lava Jato, o Brasil certamente seria outro.  Felizmente o STF corrigiu esta postura inicial hesitante para recolocar a juridicidade acima da popularidade. Porém, as baixas contabilizadas neste período são impactantes, tanto na destruição da reputação da classe política, quanto na devastação de empresas e na geração de empregos.

A situação mudou e o STF é o grande responsável pela mudança. Agiu firmemente na defesa da democracia e do estado de direito diante das fortes ameaças, concretizadas com a tentativa de golpe do dia 08 de janeiro deste ano.  Mas, nada garante que este cenário tenebroso já tenha acabado. Lava Jato ainda respira por aparelhos e de vez em quando dá sinais de vida. Movimentos radicais ainda florescem no País e a polarização política é uma realidade. Portanto, com a volta ao topo do cenário político, eleito com margem bem estreita é desejável que o Presidente Lula tenha todo cuidado na indicação dos próximos ministros.

Embora acredite que a memória dos tribunais não permitirá o retorno da barbárie praticada pela república de Curitiba, é natural que se fique precavido, pois como diz o provérbio “cachorro mordido por cobra tem medo de linguiça”. Não vejo, na postura do Presidente Lula, a ideia de indicar vassalos, mas sim indicar pessoas que ele confia plenamente na sua firmeza de posições jurídicas e que não se curvarão aos gritos transloucados da opinião publica.

Um STF forte é fundamental para o novo momento do País

A história do STF está repleta de exemplos em que a famosa “gratidão pela indicação” não perdura por muito tempo. É, portanto, no perfil do indicado e na sua real crença na defesa da Constituição que se deve apostar. Reconheço que a representatividade social não será o primeiro parâmetro desta nova escolha. O Brasil precisa do STF forte e para isso são necessários ministros fortes de caráter e de opinião jurídica, democrática e justa. Ministros que respeitarão os preceitos constitucionais da ampla defesa, do estado de direito e dos direitos e garantias individuais, sejam eles homens, mulheres, brancos, pretos, pardos, indígenas, amarelos homossexuais, heterossexuais, ou LGBTQIS+.  

Meu saudoso pai, figura importante do judiciário brasileiro, me contava que, durante a ditadura militar, os ministros do STF eram escolhidos pelo seu profundo conhecimento jurídico sem nenhuma promessa de favores, pois os militares de alta patente acreditavam que com o fim da ditadura deveriam ser julgados pela lei, sapiência e crença dos ministros e não por eventuais favores a quem já não estaria no poder. Com isso, o Brasil teve excelentes ministros num período em que a política não passava pelos tribunais superiores.

Se o Brasil conseguir se estabilizar politicamente, as futuras indicações ao STF deverão voltar ao trilho da prioridade por maior igualdade representativa da sociedade brasileira. Por ora, é exigir demais que este critério, embora republicano, mas que não gera nenhum capital político, prevaleça sobre a certeza da “morte morrida, ou morte matada” do maior escândalo mundial de corrupção judiciária praticada pela república de Curitiba, diretamente responsável pelos ataques frontais ao regime democrático do País. Daí porque consigo entender a posição do Presidente Lula, embora torça por maior representatividade social.

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Maurício Ferro

O que o futebol, vinhos, direito, política e economia têm em comum? Muito mais do que você imagina. E ao contrário do que prega o ditado popular, podem e devem ser debatidos e analisados sim. Sejam bem-vindos ao site de Maurício Ferro, um canal para se criar e trocar pensamentos e opiniões. Maurício Ferro é advogado, formado pela PUC do Rio de Janeiro, com mestrado e especializações realizadas em universidades como a London School e University of London. Cursou OPM na Harvard Business School. Autor de trabalhos publicados nas áreas comercial e de mercado de capitais, e com atuação no Conselho de Administração de grandes empresas, fundamentou sua carreira jurídica e executiva com foco do Direito Empresarial. Mas sua paixão vai além do mundo corporativo. Flamenguista apaixonado, Mauricio conhece os meandros do mundo profissional do futebol e de outros esportes. É sócio em empresas inovadoras como a 2Blive, uma startup global focada em soluções tecnológicas para suprir a carência no ensino, especialmente em áreas de grande necessidade como a África. Investe ainda na empresa Flow Kana, sediada na California, e voltada para a produção científica da Canabis para diversos fins, como medicinal, produção de roupas ou uso recreativo. A todos esses ingredientes, adicione ainda um profundo conhecimento sobre vinhos e os caminhos deliciosos da enologia. Essa é a receita do que vocês encontrarão por aqui.

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