A Morte Civil
O canalha, quando investido de liderança, faz, inventa, aglutina e dinamiza massas de canalhas.
Nelson Rodrigues
Nesta semana, o Ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, escreveu o epitáfio da operação Lava Jato com a seguinte frase: “Maior erro do judiciário brasileiro”.
O Ministro define a operação Lava Jato como “uma armação fruto de um projeto de poder de determinados agentes públicos em seu objetivo de conquista do Estado”. Diz o Ministro Toffoli que “…esses agentes desrespeitaram o devido processo legal, descumpriram decisões judiciais superiores, subverteram provas, agiram com parcialidade e fora de sua esfera de competência”. O Ministro continua: “…em última análise, não distinguiram, propositadamente, inocentes de criminosos. Valeram-se, de uma verdadeira tortura psicológica, um PAU DE ARARA DO SECULO XXI, para obter “provas” contra inocentes”.
Cada vez mais se tem a real noção do tamanho da deslealdade da chamada república de Curitiba. Juízes e procuradores, umbilicalmente unidos num projeto político de poder e obtenção de riqueza pessoal, que, não só cuspiram nos direitos e garantias constitucionais de cidadãos, como escarraram na classe política e jurídica e destruíram setores econômicos empresariais, causando milhões de desempregos com perda de renda familiar e vultosos prejuízos financeiros ao País.
Desmascarados por uma sutileza do destino é de dar ânsia ler as mensagens eletrônicas fétidas destes procuradores com deboches e zombarias ao sofrimento de centenas de famílias. Debochavam da morte de parentes de preso; riam das escutas clandestinas que faziam dos advogados de defesa e com sarcasmo digno de biltres combinavam com o Juiz pilantra os passos seguintes para manter a mídia entretida.
O julgamento social não é remediado pelo reparo jurídico
Por mais que se desmascare esta aberração jurídica e se desinfete a alma com a possibilidade de se colocar na cadeia estes trapaceiros da lei, os danos que causaram à sociedade e aos indivíduos são irreparáveis.
Pessoas, injustamente alcançadas pela nefasta operação, acabaram sendo absolvidas em outras jurisdições. Mesmo assim, convivem e conviverão pelo resto da vida com o trauma do sofrimento e com as cenas de exposição na mídia e nas redes sociais de seus depoimentos, prisões e exposição de familiares.
Seus filhos sofreram preconceitos nas escolas, os bancos cancelaram suas contas correntes, foram expulsos de clubes recreativos e outros tiveram seus vistos de entrada em demais países cancelados. Alguns sofreram perseguições em outros países. Foram abandonados pelos amigos ou, supostos amigos e, até mesmo familiares lhe deram as costas. Parafraseando o filósofo Karl Marx, deixou de ser um ser social.
Mesmo que inocentado no âmbito penal, um réu da Lava Jato não conseguirá retornar a sua vida civil com naturalidade. Na realidade da vida atual, cercada de controles e regras de conduta que buscam prioritariamente a aparência em detrimento da verdade, terá dificuldade de coisas simples, como vender ou alugar um imóvel. Instituições financeiras não lhe concederão crédito e nem às empresas da qual eventualmente participe. O compliance das empresas privadas não aceitará contratação de pessoas com este nível de exposição, ou seja, este indivíduo, mesmo que inocentado, teve sua morte civil decretada. Tornou-se um nada social, uma mera alma vagante no mundo privado.
A Constituição Federal Brasileira traz o preceito da presunção de inocência. Ou seja, ninguém será privado de liberdade ou direitos até que uma decisão final estabeleça sua condenação. Na prática, e com o advento da internet, a condenação civil se dá quando a mídia e as redes sociais entram em campo. Ser inocentado no futuro pouco importa, pois o que vale é o momento, o agora. O episódio da escola de base em São Paulo e o suicídio do reitor da faculdade de Santa Catarina ilustram bem este conceito.
Ruy Barbosa dizia que “Justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta”. Portanto, a noção de tempo é crucial para a definição de justiça. A decisão do Ministro Toffoli lava a alma dos inocentes, mas chega tarde demais para que renasçam da morte civil.
2 Comments
Caro MF,
Parabéns por trazer a nu a realidade do que significa violar o due process of law!
Nos dias de hoje, pior ainda, com veredicto instantâneo e permanente!
“……não se pode enganar todo o povo, todo tempo.”
Esse statement está se provando, mais uma vez. Mas o dano as empresas, empregos, pessoas e famílias, esse nunca será curado, como voce bem disse, e como voce bem sabe, amigo Mauricio. Ao fim e ao cabo, o Direito vai prevalecer e remanescer, como vivem os bons vinhos. E as rolhas podres, essas serão convenientemente descartada. Abraço fraterno .