Racismo não precisa de VAR
Não venham com aquele velho chavão de que “há espanhóis racistas, mas a Espanha não é racista”. Sei que toda generalização é errada, mas neste caso, o “politicamente correto” que se exploda. Há situações extremas que demandam reações duras e contundentes. Olhar a floresta e não somente a árvore. A Espanha é racista.
A recorrência do racismo é um fato. Na Europa, a questão vai além do que é tolerável, se é que deve haver algum grau de tolerância nisso. Após toda reação global, que extrapolou os gramados do estádio Mestalla, a Europa, e principalmente a Espanha, devem agir. Chega de nota burocrática simpatizante à causa do racismo. Posicionamento do tipo “vamos investigar se de fato houve a ofensa”. O racismo não precisa de VAR para checar erro grosseiro das pessoas. Ele simplesmente existe e se manifesta de várias formas. A era das desculpas protocolares já passou. Agora se cobram atitudes contundentes e reais. Não basta prender alguns poucos agressores. É preciso que haja medidas efetivas, como a Europa está acostumada a fazer quando lhe convém. Fiquei estupefato em saber que na Espanha sequer é tipificado o racismo como crime. Chama-se de crime de ódio. Ora bolas, ódio tenho eu ao ver estas cenas lamentáveis na televisão e as atitudes canhestras e preconceituosas. O racismo existe num grau elevado na Europa porque é natural, aceitável e banalizado, sem importância por lá.
Para termos uma idéia, só com o Vinicius Jr. nesta temporada 22/23, já foram 11 casos de racismos em diferentes estádios. De norte a sul, leste a oeste os exemplos se multiplicam e ganham cada vez mais agressividade. Nos primeiros casos são “apenas alguns idiotas” a gritarem macaco. Depois passaram a atirar bananas em campo. Mais a frente, penduraram um boneco enforcado com a camisa do jogador e agora um estádio inteiro xinga o menino de macaco. Às favas, de novo, esta história de politicamente correto, o povo espanhol, que é racista, precisa dar uma resposta digna e contundente. Se não o fizer passará recibo de racista. Se com um ídolo do maior time de futebol da Espanha o racismo acontece neste grau, imaginemos o que acontece com as demais pessoas pretas que vivem na Europa.
Não quero equiparar este caso com a invasão da Rússia na Ucrânia, mas serve a comparação para vermos como as reações podem ser rápidas e duras quando a Europa se mobiliza.
Reação da Liga Espanhola torna o crime ainda maior
Além dos xingamentos, me pauto na posição das autoridades e da imprensa espanhola depois do ato criminoso. Espantam e horrorizam mais ainda. É de dar nojo ouvir o presidente da liga espanhola, Javier Tebas – simpatizante declarado da direita radical que prega, dentre outras coisas, o fim da criminalização da violência doméstica, critica casamento homoafetivo e apoia limpeza étnica na Espanha – acusar o jogador ofendido de manchar o nome da liga e do Real Madrid. Não sei nem o que dizer para este desqualificado. O campeonato espanhol vai terminar em breve, está nas últimas rodadas e logo os times entrarão de férias. Tenho certeza de que o assunto vai esfriar depois do fim do campeonato.
Para piorar, ontem a CBF anuncia um amistoso da seleção brasileira masculina de futebol justamente na Espanha na próxima data Fifa em junho. A não ser que a CBF esteja planejando dar um troco forte aos espanhóis, como por exemplo somente convocar jogadores pretos e estender uma faixa gigante com dizeres de repudio a Laliga e afirmando que a Espanha é racista, não faz o menos sentido este amistoso.
Não existe bala de prata contra o racismo. A questão vai além da punição a torcedores, clubes e ligas, mas deve começar por aí. O Mastalla precisa ser interditado. O Valencia ser rebaixado automaticamente. A Uefa e a Fifa precisam sacudir fortemente o futebol, que é assistido por bilhões de pessoas. O Real Madrid precisa se posicionar esportivamente, deixar de ser omisso e se não apoiar 100% o jogador, que o deixe livre para jogar em outro lugar, pois com isso dará a mensagem clara de que na Espanha a sociedade não permite o sucesso de pretos, pobres do terceiro mundo, que se revoltam contra o racismo. Estes, ou aceitam o racismo e se calam, como tantos outros fazem, ou vão jogar alhures. O futebol precisa ser imediatamente paralisado quando houver ato racista.
Torço para que este ato do Vinicius jr seja realmente um divisor de águas no racismo mundial. Assim como Rosa Parks, ativista negra que, em 1955, no Alabama (EUA), se recusou a ceder um lugar no ônibus para uma pessoa branca, ou ainda como Martin Luther King, que liderou um movimento para que negros pudessem entrar numa piscina num hotel em 1965.
O problema, evidentemente, está na sociedade espanhola, na Europa e na banalização do racismo por lá.
2 Comments
Adorei o artigo. Exatamente como penso.
Muito boa a ilustração